Só por manifesta felicidade ou inacreditável coincidência é que a opção política (que, reconheça-se, não é apenas portuguesa, antes parece ter-se tornado viral nos tempos mais recentes e em muitos Estados-Membros da União Europeia) de trocar autorizações de residência, ou mesmo aquisição de nacionalidade (dos Estados-Membros, mas também europeia, fruto do disposto na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia) por investimento (ou seja: autêntica compra ou aquisição dessas autorizações) por determinado montante de investimento estrangeiro, não dava para o torto e não potenciaria situações de lavagem de dinheiro e de fomento da criminalidade transnacional. A notícia hoje divulgada, de que a Polícia Judiciária deteve um chinês procurado no seu país por burla – o homem tinha obtido recentemente uma autorização de residência ao abrigo dos chamados vistos gold – só pode espantar ou surpreender os desatentos. Numa Europa que aboliu fronteiras e potencia a livre circulação de pessoas (e bens, e capitais) entre os seus diferentes Estados-Membros, conceder permissão de residência ou mesmo conferir nacionalidade em função da riqueza, privilegiando o ter e ignorando o ser, pode trazer, no imediato, réditos consideráveis e investimentos vultuosos. Mais tarde ou mais cedo, porém, a medida acabará por ser declarada desconforme com as regras que subjazem à própria União Europeia e causadora de mais malefícios do que benefícios. Pode demorar a que cheguemos lá. Mas é inevitável que vamos lá chegar. No dia, no momento e na hora em que o político voltar a predominar sobre o económico. Em que, para as sociedades, não seja indiferente saber as origens e proveniências do património possuído ou exibido. Nessa altura, estas medidas serão expurgadas dos ordenamentos jurídicos europeus. Pode demorar, mas esse dia há-de chegar.