Passou praticamente ao lado da atenção mesmo da comunicação social especializada o primeiro debate travado na passada semana entre os dois principais candidatos ao cargo de Presidente da Comissão Europeia: o luxemburguês Jean-Claude Junker – que foi durante quase 19 anos Primeiro Ministro do Luxemburgo e oito anos Presidente do Eurogrupo, apoiado pelos democratas-cristãos e conservadores do Partido Popular Europeu – e o alemão Martin Schulz – actual Presidente do Parlamento Europeu desde 2012, apoiado pelos socialistas e sociais-democratas do Partido Socialista Europeu.
Se a atenção que entre nós foi dada e dispensada ao primeiro debate entre os aspirantes àquele que, incontestavelmente, é reconhecido como um dos mais importantes e relevantes cargos internacionais que existem – o de Presidente da Comissão Europeia – corresponder ao interesse que as próximas eleições europeias vão suscitar entre os nossos concidadãos, teremos razões de sobra para temer muito seriamente sobre o índice de participação cívica no referido ato eleitoral. Decerto: não será nas próximas eleições europeias que será escolhido diretamente pelos europeus – como, penso, deveria suceder – o próximo Presidente da Comissão Europeia. Este, será eleito pelos membros do Parlamento Europeu que vão ser escolhidos no próximo dia 25 de maio após proposta que lhes será apresentada pelo Conselho Europeu. Serão pois, em primeira linha, os chefes de Estado e de governo dos 28 Estados-Membros da União Europeia quem apresentará à Assembleia Parlamentar europeia o nome do candidato a Presidente da Comissão, cabendo ao Parlamento Europeu aprovar (ou recusar) tal proposta. É um processo complexo – como complexos são, por regra, todos os processos decisórios europeus – em matéria onde devia imperar a simplicidade e a transparência. Infelizmente, a União Europeia ainda não atingiu tal grau de maturidade política. Adiante.
O debate em causa, porém, teve alguns contornos relevantes e que devem merecer reflexão e alguma meditação. Ao contrário do que se poderia supor, foram mais os pontos de convergência e de consenso do que os pontos de divergência ou de dissenso entre ambos os candidatos. Talvez com maior precisão e rigor: nos aspetos verdadeiramente fundamentais e estruturantes sobre a leitura da atual situação de crise e a visão para o futuro da União Europeia, foi evidente o acordo existente; os desacordos evidenciados foram remetidos para os aspetos secundários ou menos relevantes. De certa forma e por alguns momentos, assistindo ao debate em direto, recordei os tempos em que, historicamente, as duas grandes famílias político-ideológicas que recuperaram a Europa do cataclismo da segunda guerra mundial (a democracia-cristã e o socialismo democrático) tiveram de se colocar de acordo em prol da construção e da edificação do projeto europeu que no momento presente se encontra em fase de lenta agonia.
Duas questões, todavia, devem ser retidas de todo este processo conducente à escolha do próximo Presidente da Comissão Europeia: escutando os dois principias candidatos ao cargo, neste debate e nas restantes ações que têm promovido no quadro das suas campanhas, ficamos com a certeza que não será tão cedo que a Europa da União, que tem como um dos seus principais problemas o volume da dívida pública de muitos dos seus Estados.membros, dará o passo em frente decisivo no processo do seu aprofundamento no domínio económico-financeiro enveredando pelo caminho da partilha do risco dessas mesmas dívidas públicas, procedendo à respetiva mutualização (sob qualquer uma das diferentes possíveis modalidades que tal mutualização poderia revestir). Junker, que chegou a admitir tal possibilidade a médio prazo, veio agora, no Congresso da CDU alemã e na presença da Chanceler Angela Merkel, estender esse mesmo prazo e remeter para um futuro relativamente indefinido e incerto uma tal decisão. Schulz já afirmou não ser esse o caminho para a resolução do problema da crise das dívidas soberanas dos Estados-membros da União. Ou seja, desengane-se quem pense que, com Schulz ou com Junker, a futura Comissão Europeia irá pugnar pela mutualização das dívidas públicas dos Estados da União.
A segunda questão que, seguramente, não deixará de estar subjacente à escolha do próximo Presidente da Comissão Europeia será, incontornavelmente, a questão da nacionalidade. Pese embora o largo e amplo consenso evidenciado entre Junker e Schulz, não será a mesma coisa o executivo de Bruxelas ser liderado por um alemão ou por um luxemburguês. Mesmo que este luxemburguês seja, em muitos aspetos, um avalista das políticas e posições mais ortodoxas preconizadas pela chanceler Merkel (manda a verdade dizê-lo, decerto, que se assim não fosse também talvez não tivesse oportunidade de discutir a presidência da Comissão Europeia pelo Partido Popular Europeu….). Ter um alemão ou um luxemburguês à frente do executivo comunitário será, seguramente, diferente. E na sequência de todos os acontecimentos que se têm abatido sobre esta Europa da União, em marcha acelerada para a irrelevância política, que podemos considerar como absolutamente dispensáveis, a simples possibilidade de virmos a ter o executivo comunitário de Bruxelas liderado por um alemão não seria, por certo, das menos importantes. É critério que não poderá ser desconsiderado quando chegar o momento alfa.