by João Pedro Simões Dias | Mar 17, 2014 | Diário
Passos Coelho vai receber, em audiência, António José Seguro para discutirem a forma como Portugal vai sair do Programa de Assistência Financeira a que está submetido. Poderia ser uma boa notícia. Poderia ser porque, com toda a probabilidade, não o vai ser. Nem o tom do convite nem o tom da aceitação do mesmo deixam transparecer qualquer vontade sincera de ser obtido um acordo entre o governo e o principal partido da oposição em matéria tão sensível. Passos convida porque sim; Seguro aceita porque não pode negar. Ficaria tão mal a um não convidar quanto ao outro não aceitar. Logo – não passaremos do simples plano do mais puro formalismo institucional. Na véspera de ser recebido por Merkel, Passos quer levar no bolso a fotografia do encontro com Seguro – não para inglês ver, mas para alemã contemplar. Na sua caminhada para vencer as eleições, Seguro não se pode dar ao luxo de recusar uma postura institucional, reunindo com o chefe do governo e aparecendo a seu lado na foto e imagens da praxe. Faz parte do preço que tem a pagar na sua estrada de Damasco que pretende que o conduza a São Bento. De fora disto tudo, vai continuar o país. Ao lado destes jogos políticos e destes encontros feitos de aparência e ausência de conteúdo. No máximo ambos vão constatar que discordam e acordar no respetivo desacordo. Há muitos anos, pela década de sessenta do século passado, uma crise por que as Comunidades Europeias passaram, a crise da “cadeira vazia” que se julgou das mais graves até ter acontecido a atual, terminou com um pseudo-acordo – os célebres “Acordos do Luxemburgo” – que ficaram conhecidos como o “acordo para discordar”. Passos e Seguro seguramente vão dar passos no sentido de afirmarem o seu desacordo. Nisso irão estar de acordo.
by João Pedro Simões Dias | Mar 15, 2014 | Diário
Marques Mendes continua a misturar informações de relevo e relevantes com interpretações que raiam e roçam o delírio. É relevante a informação dada sobre a discussão provocada no âmbito do Tribunal Constitucional sobre o momento adequado para decidir da matéria sensível que tem entre mãos. Informação relevante mas, a ser verdadeira, igualmente preocupante – demonstra um Tribunal Constitucional que age e actua, também, em função de um determinado calendário político. De um calendário político próprio. E isso é grave e não pode deixar de se lamentar. Se o timing das decisões se submete a um critério de oportunidade política, nada nos garante nem assegura que as próprias decisões que toma não sejam, também, ditadas por razões e motivações políticas. Ora, estando a falar de uma instância jurisdicional, pode ser grave. Muito grave. Mas para além disso há a componente do delírio: criticar o célebre Manifesto dos 70 invocando que, para além de pretender “entalar” o líder da oposição, o governo e o próprio Presidente da República os mentores do manifesto se tivessem conseguido a cobertura de Cavaco Silva queriam transformar-se num movimento com intervenção política efetiva no País, ultrapassa o próprio delírio. Raia a comédia. Imaginar que aquelas almas, que se conseguiram pôr de acordo apenas em matéria relacionada com a reestruturação da dívida pública nacional, podiam aspirar a uma intervenção política efetiva no País, é comédia pura. Infelizmente, os tempos não estão para este tipo de comédias.
by João Pedro Simões Dias | Mar 15, 2014 | Diário
Estava e andava enganado quem pensava que quarenta – sim, quarenta! – anos após o 25 de Abril de 1974, os principais agentes e intervenientes no debate político e social já haviam absorvido na totalidade as regras e o respeito pelo mais elementar funcionamento da democracia. Parece não ser assim. A propósito de uma simples votação na Assembleia da República, não faltaram lamentáveis declarações que encerraram e revelaram profundo desrespeito por aquilo que o funcionamento normal das regras e princípios democráticos acabavam de ditar. Considerar o resultado de uma votação democrática como “absolutamente chocante” ou equiparar Portugal à “Rússia, Roménia e Ucrânia” diz-nos tudo sobre o respeito e a ética democráticas de quem assim atua e não se coíbe de expressar estes juízos de valor. Faltou, de facto, aos deputados que constituiram a maioria pedir desculpas formais à minoria pelo simples facto de, sendo mais, terem obtido ganho de causa numa determinada votação. Não haja dúvidas – há momentos em que as regras democráticas são muito aborrecidas, muito chatas. Deviam ser postergadas. Deviam triunfar os minoritários, quem tem menos votos. São ética e moralmente superiores. Estão do lado certo da história. Do lado do progresso, da vanguarda, à frente do seu tempo. Faltam-lhes apenas os votos. Mas isso são detalhes e pormenores. Irrelevâncias.
by João Pedro Simões Dias | Mar 14, 2014 | Diário
Ainda o célebre Manifesto….. vejo por aí que um dos argumentos mais invocados para derreter o texto prende-se com o facto de ele poder preconizar a transferência para as gerações seguintes de dívida que incumbiria às gerações atuais pagar. Creio ser dos argumentos mais sérios, graves e perigosos que podem ser invocados. Estamos a entrar em domínios perigosos. Estamos a arriscar afetar decisivamente a coesão nacional, feita dum contrato intergeracional que não pode nem deve ser posto em causa. Vamos deixar às gerações seguintes essa dívida e esse passivo? Com certeza que sim! Mas também lhes vamos deixar muitos activos de que vão usufruir e que não pagaram, tal como aconteceu com as gerações anteriores relativamente à nossa. Também nós usamos e fruímos de bens pagos pelas gerações anteriores e também estamos a pagar dívida que não contraímos. É perigoso enveredar-se por essa argumentação. E só recorre a ela quem não tem outro tipo de argumentos para apresentar e aduzir. A essência de uma Nação faz-se da coesão das suas múltiplas e sucessivas gerações e não pode ser construída a benefício de inventário, aceitando apenas aquilo que é positivo e recusando o que é negativo, custo ou encargo. É, de todos os argumentos que tenho escutado, perdoe-se-me a rudeza das palavras, o mais estúpido de todos. E além do mais, além de ser falso e destorcido, é perigoso em termos de coesão nacional. Este sim – contribui e potencia o tristemente célebre “cisma grisalho”.
by João Pedro Simões Dias | Mar 13, 2014 | Diário
Foram mais de 70, da esquerda à direita, que se atravessaram por uma ideia que muito irritou o senhor Primeiro-Ministro, que nem tentou esconder ou disfarçar o mal-estar: reestruturar a dívida pública portuguesa. Na extensa lista de signatários contam-se ex-Ministros da Finanças, de diversa origem e diferente proveniência política; não sendo suposto que a ideia de defesa do interesse nacional seja propriedade em exclusivo de alguns especialmente dotados e iluminados pela providência divina, talvez a forma mais inteligente de reagir ao manifesto fosse admiti-lo como ponto de partida para um diálogo intelectualmente sério e honesto e como primeira manifestação concreta do tal consenso que muitos andam reiteradamente a pedir e insistentemente a inconseguir. Em vez disso, exonerando ou aceitando pedidos de exoneração, foi o próprio Presidente da República a dar sinais de falta de abertura para o diálogo e para a discussão; e das mais variadas proveniências choveu argumentário pouco sério e intelectualmente desonesto. Querer assimilar ou equiparar os conceitos de “reestruturação de dívida” e de “perdão de dívida” foi só, talvez, o mais acabado exemplo dessa argumentação intelectualmente pouco séria, politicamente pouco honesta e, diz quem sabe, cientificamente pouco exacta. Nesses termos, não há debate que resista nem consenso que possa ser edificado. São expressões sem conteúdo e palavras destinadas a serem levadas pelo vento.