Uma Catalunha independente?

No passado domingo a Catalunha foi a votos para, num arremedo de referendo, se expressar sobre a sua independência. O fundamento para a realização dessa espécie de referendo foi, assim nos foi dito, o exercício democrático do direito dos catalães a expressarem a sua opinião sobre o seu futuro político. Tratou-se, portanto, assim foi contado ao mundo, de uma manifestação do princípio democrático. Acontece, porém, que se levarmos a análise a um maior grau de profundidade e não nos ficarmos pela superficialidade da espuma dos sias, talvez esse dito princípio democrático tenha muito pouco de democrático.

Os organizadores do dito referendo limitaram-se a constatar que, a simples possibilidade de os catalães depositarem um papel numa urna, significaria que se estava perante um exercício de democracia. Nada mais falso, nada mais errado, nada mais desconforme com as regras e os princípios. É verdade que, sem votos, não existe democracia. Nenhuma democracia pode prescindir do exercício inalienável do direito de escolhe e esse direito exerce-se através do voto. Acontece, porém, que o voto, por si só, não é suficiente para demonstrar a existência de uma democracia. Também se vota na Venezuela. Também se vota na Coreia do Norte. Também se votava no Portugal de antes do 25 de Abril. E a ninguém de bom-senso passará pela cabeça sustentar ou defender que, na Venezuela, na Coreia do Norte ou no Portugal salazarista vigoravam regimes ou sistemas democráticos. Assentemos, portanto: sem votos não há democracia; mas o voto por si só não chega para afirmar a existência da democracia. Esta, para existir, na sua plenitude, supõe e exige que, a montante, antes do momento de se exercer o voto, estejam reunidos um conjunto de requisitos e pressupostos, também eles definidores do princípio democrático: no momento de apresentação de candidaturas, no momento de fixação de garantias sobre a forma como as votações decorrem, no momento de contagem e apuramento de resultados, no momento de fixação do colégio eleitoral, no momento de composição de assembleias de voto, etc, etc. Em todos esses momentos, a montante e prévios ao exercício do direito de voto, as regras democráticas da transparência e da legalidade hão-de estar presentes se quisermos ou pretendermos estar ante uma verdadeira manifestação do princípio democrático. Ora, nada disto ocorreu, no passado domingo, na Catalunha.

O pretenso referendo foi convocado à revelia da lei e por quem não tinha competência legal para o fazer; os cadernos eleitorais não existiam, possibilitando que um cidadão votasse mais de uma vez; as urnas não funcionaram em assembleias eleitorais devidamente constituídas mas chegaram a estar postas na rua; o secretismo do voto pura e simplesmente não existiu; as garantias de regularidade e transparência do processo eleitoral eram palavra vã; o apuramento dos resultados chegou a dar percentagens totais que em alguns casos ultrapassavam os 100%….

Tudo isto, e muitas outras irregularidades que se poderiam apontar, é suficiente para demonstrar o contrário do que se pretendeu afirmar com a realização do dito referendo: em nada o mesmo contribuiu para ilustrar o exercício da democracia por parte dos catalães.

E, como era de esperar, foi-nos dito que uma ampla maioria de votantes, na ordem dos 92% haviam votado a favor da independência da Catalunha. Com um tal enquadramento o espanto só pode, mesmo, residir na percentagem de votos que é indicada: “só” 92%? Obviamente que a própria comunidade internacional não esteve desatenta e não há notícia de quem quer seja, até agora, ter reconhecido tal referendo. Eventualmente, apenas Nicolas Maduro….

O problema é que, segundo notícias recentes, será este simulacro de referendo que estará na base das exigências do sector mais nacionalista do governo autónomo da Catalunha para, dentro de horas, proclamar a independência unilateral da Catalunha. Ora, a ser verdade e a confirmar-se um tal passo rumo ao abismo, parece inevitável que ao governo de Madrid outra opção não restará do que utilizar a sua bomba atómica constitucional – célebre artigo 155º da Constituição que prevê as situações em que o poder central possa derrogar e reverter as autonomias. Como se percebe, seria uma solução para a rebelião mas não uma solução para o problema.

As autoridades centrais de Madrid desde sempre enfrentaram este desafio no plano jurídico, remetendo sempre para os Tribunais as decisões mais difíceis de tomar. Nunca assumiram a vertente política do caso e, por isso, nunca encetaram verdadeiras negociações políticas com as instâncias autonómicas de Barcelona. Foi um erro crasso que seguramente ainda lhes virá a custar caro. Mais caro do que já custou. É que se na Catalunha nem todos são independentistas ou soberanistas, quase todos ou a imensa maioria são, neste momento, anti-madridistas. E isso em nada contribui para a resolução do diferendo que existe, que é real e que está instalado.

Numa palavra, o desatino com que este processo tem sido conduzido de parte-a-parte só pode levar a uma “solução lose-lose”, em que ambas as partes saem perdedoras. Não se adivinha saída mais provável para esta crise. Em qualquer dos casos, parece certo que, por muitos e longos anos, a Espanha que conhecemos já acabou. Doravante será, sempre e necessariamente uma coisa diferente. Podemos não saber o quão diferente será. Mas será, certamente, diferente. Com ou sem a Catalunha.

Uma nova normalidade

Os tempos mais recentes têm sido pródigos em notícias esparsas, aparentemente não relacionadas entre si, que nos dão conta da realização de “pequenos” crimes cometidos um pouco por toda a Europa, tendo por alvo quer agentes de forças de segurança, quer militares, quer simples cidadãos individuais e indefesos. Por regra, são incidentes com viaturas automóveis, atropelamentos, crimes cometidos com armas brancas proibidas, um ou outro com armas de fogo. Crimes que, nas sociedades ocidentais de há poucos anos se incluiriam na lista da pequena criminalidade que deveria ser tratada no âmbito da segurança pública.

Acontece que, a ligar todas estas ações criminosas, tem surgido quase sempre a sua reivindicação por parte do Daesh – que tanto reclama a autoria e paternidade dos grandes atentados como o de há duas semanas em Barcelona como, simultaneamente, reivindica os “pequenos” crimes praticados em Bruxelas, em Cambrils, em Estocolmo ou em Turku, por exemplo.

Significa isto que, hoje em dia, face à radicalização jiadista em curso em muitas comunidades muçulmanas, nenhum lugar, verdadeiramente nenhum lugar, do Ocidente se pode considerar um lugar seguro e um lugar onde estejamos a salvo dos que invocam Deus para cometerem toda a espécie de barbárie e de carnificina. E que, cúmulo dos cúmulos, justificam essa mesma barbárie com a invocação desse mesmo Deus. Paradoxos e contradições.

Mas isto significa, também, que não basta nem chega proclamar que não devemos deixar que os terroristas condicionem e determinem o nosso modo de vida e influam sobre as nossas decisões. É falso. É mentira. Por muito que nos custe termos de o admitir, os terroristas já condicionam e já determinam e já influem sobre o nosso modo de vida. E, no mínimo, ingénuo será todo aquele que programar qualquer alteração à sua rotina diária sem levar em consideração essa nova normalidade que se instalou nas nossas vidas e na vida de muitos dos nossos concidadãos europeus (sim, porque não nos esqueçamos que todos nós, europeus dos Estados da União, além de sermos cidadãos de cada um dos seus Estados, estamos unidos por uma cidadania comum que é a europeia; uma cidadania que tem a particularidade de, pela primeira vez, nos aparecer dissociada do conceito de nacionalidade).

É, pois, com uma nova normalidade que temos de nos confrontar.

Nessa perspetiva, o desafio que temos pela frente não pode nem deve ser a negação dessa mesma realidade que a todos se nos impõe e que a todos nos condiciona. Fazê-lo equivaleria a usar a tática da avestruz, enfiando a cabeça na areia para não vermos nem conhecermos dessa mesma realidade.

Pelo contrário – o desafio que temos por diante passa pela adoção de todas as medidas que se afigurem necessárias para reverter essa nova normalidade, não nos conformando com ela, mas partindo do princípio – inteligente – de que ela está aí e veio para ficar se nada fizermos para a alterar.

E no domínio das medidas a tomar, um princípio existe que se afigura inquestionável. Nenhum Estado, hoje em dia, tem a possibilidade de, por si só, isoladamente, combater este fenómeno do terrorismo hodierno. Nenhum Estado. Impõe-se, inelutavelmente, reforçar e aprofundar a cooperação internacional no combate ao terrorismo. E não deixar que este reforço e este aprofundamento se limite a nobres proclamações, de muito escasso efeito prático.

Se levarmos em consideração que, só no quadro dos Estados-membros da União Europeia existem mais de 50 serviços e autoridades com competências (nacionais ou regionais) para atuarem nos domínios da prevenção e combate ao terrorismo, percebemos com facilidade que a ineficácia terá de ser a regra e a norma. Talvez, por isso, começar por criar um serviço europeu, supranacional, de informações e inteligência possa ser o ponto de partida para um eficaz combate multidisciplinar a este fenómeno novo que já condiciona as nossas vidas e a nossa nova realidade. Dir-se-á: tal constituiria mais uma diminuição do que resta da soberania dos Estados. É verdade. Mas perante desafios transnacionais, a resposta não pode ser nacional. Será, provavelmente, o menor dos preços que teremos a pagar para garantia da nossa segurança.

Catalunha, 1 de outubro

Tem passado significativamente ao lado quer da nossa opinião pública quer da nossa opi­ nião publicada a verdadeira querela autonómica-constitucional que, por estes dias, se vai travando aqui ao lado, em Espanha, a propósito do referendo autonómico que a Generali­ tat da Catalunha convocou unilateralmente para o próximo dia 1 de outubro e que o governo central de Madrid tem contestado e ameaça impedir por todos os meios ao seu alcance. A pergunta que será colocada aos catalães é a seguinte: “Está de acordo com um Estado Independente sob a forma de República?” Se o “sim” vencer, a independência será declarada no parlamento catalão 48 horas depois do referendo. Se perder, serão convocadas novas eleições autonómicas. E se o Governo espanhol impedir a realização desse referendo, a secessão será proclamada de forma automática e imedi­ ata pelo mesmo parlamento.

Esta disputa em torno da marcação e eventual realização deste referendo autonómico e independentista tem dominado todo o debate político em Espanha e tem vindo em cres­ cendo de radicalização, com as duas partes envolvidas a recorrerem a todos os meios ao seu alcance para conseguir a realização do sufrágio ou para impedir a sua concretiza­ ção. A ponto de, em boa verdade, nenhuma delas ter, já, margem de recuo ou de negociação sob pena de perder irremediavelmente a face. E é esta radicalização já atingida no clima político da Catalunha que tornam o processo referendário em curso num momento potencialmente perigoso, tanto para o Estado espanhol como para a pró­ pria Catalunha.

No que à Catalunha diz respeito, a generalidade dos estudos sociológicos encarrega-se de demonstrar uma realidade iniludível: a Catalunha está partida em dois blocos pratica­ mente iguais. Significa isto que o referendo de 1 de outubro, a realizar-se e concretizar-se, ameaça assim tornar-se numa verdadeira batalha de catalães contra catalães. Com ou­ tra agravante: o próprio bloco nacionalista catalão está longe de possuir uma estru­ tura homogénea ou coerente, com uma agenda coesa e coerente. A coligação Juntos pelo Sim – formada pela Esquerda Republicana da Catalunha e o Partido Democrata Euro­ peu da Catalunha (PDeCAT, antiga Convergência) – e a CUP – Candidatura de Uni­ dade Popular – convergem no apoio parlamentar ao governo autonómico catalão, na de­ fesa da independência da Catalunha, mas não têm uma base doutrinária homogénea e comum.

Mas também do lado do bloco nacionalista espanhol – dominado pelo Partido Popular, pelo Partido Socialista e pelos Cidadãos – as divergências são profundas e assinaláveis. Une-os a recusa do referendo independentista, a negação da possibilidade de autodetermina­ ção de qualquer autonomia espanhola e pouco mais. Entre estas forma­ ções partidárias, porém, não se divisa uma coesão ou uma homogeneidade de visões so­ bre o futuro territorial daquilo que é a Espanha dos nossos dias. Nesse plano, aliás, es­ tará do lado do Partido Socialista espanhol – sobretudo muito por efeito da renovada lide­ rança de Pedro Sanchez – a abordagem doutrinária e dogmática mais consistente dessa mesma realidade da Espanha dos nossos dias, definindo-a como uma “Nação de Na­ ções”. É uma perspetiva e uma abordagem, cremos, muito mais consentânea com a reali­ dade do que aquela, por exemplo, que é sustentada pelo Partido Popular e por Mari­ ano Rajoy – que embarcam no mito e no sofisma que a Constituição espanhola consa­ gra, ao criar e referir-se a uma “nação espanhola”, realidade absolutamente mí­ tica, inexistente quer no plano dos princípios quer no domínio dos factos.

É assim, uma Catalunha profundamente dividida no quadro duma Espanha minada pelas suas contradições territoriais, que se apresta a ter uma palavra decisiva sobre o seu futuro no próximo dia 1 de outubro. Se o referendo se realizar, o dia 2 de outubro será uma incógnita tremenda. Com ondas de choque que não se limitarão a Espanha e que poderão fazer-se sentir em vários territórios da União Europeia que anseiam pelos momentos de, igualmente, se poderem expressar sobre as suas autodeterminações. Se a vontade – e a força – de Madrid se impuserem e ganharem o braço-de-ferro com Barcelona, as consequências também não se adivinham fáceis de antecipar, atendendo, sobretudo, à divisão reinante na Catalunha.
O dia 1 de outubro marcará, assim, o confronto do Estado (dotado do acervo de competências que lhe restaram) com a sua Autonomia (que busca disputar uma parcela significativa daquele acervo). Saber quem levará a melhor neste braço-de-ferro pode ser determinante para o futuro não só da Catalunha, não só de Espanha, mas também de muitos outros territórios europeus. Por isso, toda a atenção que lhe dediquemos, não será demais.

Secessionismos europeus

Vão conturbados e agitados, e não raro paradoxais, os tempos por esta Europa que teima em afirmar-se como sendo a da União, mas onde os sinais mais visíveis parece apontarem em sentido radicalmente diferente, de desunião e de crise, de marcha acentuada para o empobrecimento, de inversão do caminho da história. Esta crise que afecta o continente europeu, de resto, mais não é do que a expressão mais evidente da crise que afecta o Ocidente – de que a Europa foi durante muito tempo o rosto mais expressivo – neste tempo de “outono e falta de bússola”, para parafrasearmos o título da mais recente obra que nos é legada por Adriano Moreira. Falta de bússola que equivale a uma dramática ausência de uma escala de valores perceptível e compreen­sível e à proliferação de teses e teorias relativistas, sempre dispostas a tudo questionar e a tudo pôr em causa. Um dos mais recentes perigos com que esta Europa se está a defrontar provém dos riscos e dos perigos do fenómeno secessionista que parece querer pôr em causa a uni­dade de muitos Estados tal como os conhecemos no momento presente.
Na passada semana o Presidente da Generalitat – o governo autonómico da Catalunha –, Artur Mas, anunciou à Espanha e ao mundo que, no dia 9 de Novembro de 2014, o seu governo tenciona promover um referendo aos catalães cuja primeira pergunta será: “Quer que a Catalunha seja um Estado?”. E a que, em caso afirmativo, se seguirá uma segunda questão: “Quer que a Catalunha seja um Estado independente?”. Não há memória, nos tempos recentes, de este movimento autonomista/independentista ter chegado tão longe e ter causado tamanha proporção. Decerto – as autoridades espa­nholas – com o Presidente do Governo, Mariano Rajoy, secundado pelo líder da oposi­ção, Alfredo Pérez-Rubalcaba – vieram, de imediato, declarar que o referendo não se realizaria, por evidente e flagrante violação da Constituição espanhola que defende a unidade do Estado autonómico e chega ao ponto de ficcionar a existência de uma “Na­ção espanhola”, mormente no seu artigo 2º, que tem uma redação tão abrangente quanto controversa quando afirma que “La Constitución se fundamenta en la indisolu­ble unidad de la Nación española, patria común e indivisible de todos los españoles, y reconoce y garantiza el derecho a la autonomía de las nacionalidades y regiones que la integran y la solidaridad entre todas ellas”. A questão que merece, todavia, ficar para reflexão prende-se com as sementes que a iniciativa pode deixar e com o grau de ger­minação que podem alcançar. Mas o facto não é inédito nem original.
Três semanas antes, a 26 de novembro, em Glasgow, o líder do governo escocês, Alex Salmond, apresentou o seu livro branco sobre a independência da Escócia, tendo por referência o referendo sobre a independência do país, marcado para 18 de setembro de 2014. Alex Salmond, que é a favor do “sim” ao referendo, veio garantir que a Escócia tem “um grande potencial” enquanto país, ressalvando sempre, porém, que o mesmo teria de passar sempre por uma pertença à União Europeia. Curiosamente, ou talvez não, foi o Presidente do Governo espanhol, Mariano Rajoy, quem se apressou a vir de­clarar que se oporá à adesão da Escócia à União Europeia caso os escoceses optem pela independência. Como parece óbvio, dirigia-se a Glasgow mas falava para Barce­lona.
Num ponto, porém, os discursos catalão e escocês convergem – ambos anseiam por se sepa­rar dos Estados onde estão integrados explicitando, porém, a respectiva vincula­ção ao ideal e ao projecto europeu corporizado na União Europeia. Como já algumas vezes ti­vemos oportunidade de anotar, este é um dos mais fascinantes paradoxos do nosso tempo: pese embora a profundíssima crise que atravessa, seguramente a maior desde a sua fundação, o projecto comunitário continua a exercer enorme fascínio e imensa capacidade de atracão relativamente aos Estados que não o integram. E mesmo rela­tivamente àqueles que, ainda não sendo Estados, aspiram a sê-lo e veem a pertença à União Europeia como um verdadeiro seguro ou caução que assegure e mantenha essas independências ansiadas. Fenómeno, de resto, que não é novo – quando ruiu o Muro e implodiu a influência soviética no leste europeu, foi sob a protecção das organizações ocidentais (primeiro a NATO, logo depois a União Europeia) que as recém-recuperadas soberanias se quiseram acolher. As novas democracias foram protegidas mas o projecto europeu ficou imensamente debilitado.
Decerto – quem recordar o passado recente não poderá deixar de lembrar que a pró­pria União Europeia, e a esmagadora maioria dos seus Estados membros, muito por influência directa dos Estados Unidos (que na sua guerra contra o terrorismo queriam deixar transparecer que a mesma não era contra os Estados islâmicos), abriram as por­tas de par em par a este caminho perigoso quando reconheceram a independência do Kosovo, separando-o da Sérvia com base unicamente na uniformidade étnica, sem cu­rar de averiguar nem da viabilidade do novo Estado (militarmente defendido pelos norte-americanos e economicamente sustentado pela União Europeia) nem do poten­cial efeito contagio que tal independência podia suscitar.
Mas como a realidade se nos impõe, eis a Europa de 2014 confrontada, no mínimo, com duas crises secessionistas que poderão servir de rastilho para outras, semelhantes e não menos legítimas aspirações independentistas – do País Basco ao desmembra­mento da Bélgica, da Sicília à Sardenha, passando por outras incontáveis aspirações nacionalistas que se encontram adormecidas um pouco por essa Europa fora, com par­ticular ênfase nos territórios do antigo poder imperial soviético. Era, diria, o último problema com a Europa da União se deveria preocupar e confrontar nos tempos de emergência que atravessa. Paradoxalmente, porém, tudo leva a crer que será mais um dos problemas com que teremos de nos defrontar, a somar aos muitos já existentes.