The Hung Parliament

Há precisamente um ano, na sequência duma decisão bizarra e incompreensível do então Primeiro-Ministro britânico, David Cameron – que, de resto, acabaria por lhe custar o cargo e a carreira política – o Reino Unido enfrentava uma campanha eleitoral para o referendo que iria decidir da continuidade, ou não, do Reino na União Europeia. O resultado é conhecido: a maioria dos britânicos optaram pelo brexit, escolhendo sair da União.
A primeira consequência deste referendo, recorde-se, foi a demissão de David Cameron da liderança do governo britânico. Para dar cumprimento ao resultado eleitoral, impunha-se que o governo britânico encetasse o processo de separação de Bruxelas. Cameron, que tinha apostado todas as suas fichas no “remain”, não tinha condições, nem pessoais nem politicas, para continuar no nº 10 de Downing Street. Surpreendentemente, a bancada conservadora em Westminster acabou por escolher para liderar o governo a, até então, responsável pela administração interna nos governos de Cameron, Theresa May.
Theresa May que, no referendo acabado de realizar, havia militado na causa do seu Primeiro-Ministro e havia-se comprometido em favor da permanência do Reino na União Europeia. A perplexidade foi imediata – a condução de todo o processo de separação do Reino Unido da União Europeia iria ser confiado a alguém que, semanas antes, se havia empenhado em defender justamente o contrário, isto é, a permanência do Reino na União Europeia. Foi um começo pouco fiável e nada de molde a justificar grandes entusiasmos. Seguidamente, seria a própria nova Primeira-Ministra a, reiteradamente, afirmar que se sentia confortável com a maioria absoluta de que dispunha na Câmara dos Comuns, herdada de Cameron, e que, por isso, não tencionava convocar eleições legislativas antecipadas.
Em Abril passado, porém, prestes a iniciar as conversações com Bruxelas, numa altura em que os estudos eleitorais davam mais de vinte pontos percentuais de vantagem aos conservadores sobre os trabalhistas de um Jeremy Corbyn pouco menos do que desacreditado, May vislumbrou uma janela de oportunidade para reforçar a sua maioria, dizimar o seu adversário e fortalecer o seu poder. Violando a palavra dada, convocou eleições legislativas que decorreram na passada semana. E, contrariamente às expectativas de que partiu, em vez de reforçar a sua maioria absoluta, perdeu-a; em lugar de aniquilar o seu adversário, reforçou-o; querendo fortalecer o seu poder, acabou enfraquecida. Pela segunda vez em menos de um ano, o eleitorado trocou as voltas aos Primeiros-Ministros britânicos e puniu May como há um ano tinha punido Cameron – qual deles o menos hábil a interpretar e avaliar o sentido e o sentimento do eleitorado britânico. É certo que, desta feita, houve razões acrescidas para essa punição eleitoral que recaiu sobre May: a falta à palavra dada; a tergiversação em matéria de princípios e valores; a postura arrogante assumida durante a campanha eleitoral; propostas eleitoralmente mal apresentadas, nomeadamente de natureza fiscal; a colagem, em matéria de política externa, às errâncias de Donald Trump. E, obviamente, a questão do terrorismo; sobretudo tendo sido May, durante seis anos, a ministra responsável pela pasta da segurança interna.
Esta errada avaliação eleitoral, da exclusiva responsabilidade da Primeira-Ministra britânica, acabou por estar na origem daquilo que os britânicos designam por um “parlamento suspenso” (um “hung parliament”) – um parlamento sem maioria absoluta de nenhum partido, num país com um sistema eleitoral maioritário a uma volta, propenso à emergência de um sistema partidário de bipartidarismo tendencialmente perfeito. Os conservadores perderam a sua maioria absoluta mas, continuando a ser o partido mais votado, persistiram na indicação de Theresa May para a liderança de um governo minoritário que, tudo o indica, alcançará a maioria através de um entendimento parlamentar com os unionistas da Irlanda do Norte (DUP). É, num primeiro momento, uma aliança eivada de espinhos que podem vir a revelar-se fatais com o decurso do tempo. Uma vez mais, mais do que na questão das políticas internas, será na postura face ao brexit que se podem vir a revelar as maiores contradições deste acordo de conveniência, necessariamente a prazo. E nem parece improvável que as primeiras e mais graves contradições surjam de dentro do próprio Partido Conservador. De resto, já há notícias de movimentações internas as quais, se num primeiro momento até poderão permitir o surgimento de um novo gabinete de May, a médio prazo poderão torná-lo completamente inviável, sacrificando a sua própria liderança. Mais do que nunca, Theresa May deverá sentir-se uma Primeira-Ministra a prazo. E a prazo curto.
E o calendário promete não a ajudar. Se a apresentação do seu programa de governo (o célebre “Queens Speech”, discurso da Rainha que apresenta o programa e as diretivas do governo para o ano legislativo subsequente) já foi adiado “sine die”, para o início da próxima semana estão agendadas as primeiras conversações entre o Reino Unido e a União Europeia para concretização do brexit. Será o grande desafio que o próximo governo vai ter pela frente. E será um governo enfraquecido eleitoralmente, diminuído politicamente e minoritário partidariamente que terá de enfrentar o maior desafio político do Reino Unido desde o final da segunda guerra mundial.
Num quadro de tanta indecisão, de tanta indefinição e de tanta turbulência, não será risco demasiado voltarmos a uma convicção que já anteriormente tivemos oportunidade de expressar – há brexits que estão condenados a concretizarem-se como …… remains.

Vai o Reino Unido mudar?

Amanhã o Reino Unido vai a votos.
Na sequência do resultado do referendo sobre a permanência na União Europeia, que ditou o Brexit, e do consequente abandono do poder por parte de David Cameron, a primeira-ministra Theresa May optou por dissolver a Câmara dos Comuns para relegitimar o seu governo, reforçar a sua maioria e refrescar a sua liderança. Tudo para, em seu dizer, se encontrar em posição mais vantajosa para negociar com Bruxelas as condições de saída do Reino da União. Quando dissolveu a Câmara, as sondagens eram-lhe simpáticas: mais de vinte pontos percentuais de vantagem sobre um Partido Trabalhista anémico, radicalizado à esquerda em torno da liderança de um pouco ou nada carismático Jeremy Corbyn. May avaliou as suas possibilidades e arriscou. No entretanto, políticas internas mal percebidas ou mal explicadas, uma dose inesperada de arrogância que a levou a recusar debates eleitorais em que se fez substituir, uma colagem em muitos pontos da política externa às posições de Donald Trump e, sobretudo, a onda de ataques terroristas que teve obrigou a suspender a campanha eleitoral por duas vezes, na sequência dos ataques de Manchester e da London Bridge do passado sábado – tudo contribuiu para baralhar as opiniões e as sondagens, a ponto de, no momento em que este texto é escrito, a menos de 24 horas da abertura das urnas, os últimos números disponíveis apontem para a perda da maioria absoluta dos tories em Westminster e, necessariamente, para o surgimento de um governo mais débil, de uma maioria provavelmente só alcançada através de acordos parlamentares, ou seja, todo o contrário daquilo que Theresa May pretendia ao convocar estas eleições legislativas antecipadas.
Não seria, de resto, a primeira vez que tal sucederia. No referendo do ano passado, convocado por Cameron – e que, indiretamente, foi responsável por tudo o que se passou daí para cá em termos de estabilidade governativa britânica – a história foi a mesma: uma má avaliação do sentir e do sentimento de um povo, uma má perceção da tendência do eleitorado, que acabou por lhe custar a carreira política e mergulhar o Reino Unido no pântano de indefinição em que hoje se encontra. Theresa May que, recorde-se, no referendo do ano passado se destacou como defensora da permanência do Reino na União Europeia para, depois da queda de Cameron, acabar por aceitar liderar um governo que tinha como eixo central da sua existência fazer exatamente o oposto daquilo que ela própria defendeu e negociar com Bruxelas a saída do Reino da União, estará a ser vítima da sua própria errância política e da sua própria incoerência política. Tentou sanar ambas com o beneplácito do eleitorado e do sufrágio popular. Poderá estar a horas de ter de reconhecer ou admitir que a sua estratégia terá falhado.
Daí que, para respondermos à questão com que titulámos este texto – vai o Reino Unido mudar? – a nossa resposta só possa ser a de um receio de que, a haver mudança, a mesma seja em sentido negativo e na direção errada.
Dir-se-á – em que é que tudo isto nos toca ou nos interessa? Num mundo cada vez mais globalizado, toca-nos e interessa-nos de sobremaneira. Nós não votamos no Reino Unido nem escolhemos deputados para Westminster. Mas não nos podemos dar ao luxo de pensar que o que por lá acontece nos é estranho, alheio ou indiferente. Estamos perante uma eleição que vai influenciar significativamente o futuro da Europa na medida em que, qualquer que venha a ser o governo saído da mesma, a sua tarefa principal continuará a ser negociar as condições do brexit; nessa medida, nunca deixaremos de ser afetados pela decisão que os britânicos vierem a tomar. Estarmos atentos ao que por lá se vai passando é o mínimo que se nos pode exigir, em nome dos nossos próprios interesses e da nossa própria condição cidadã.

2013, Ano europeu em revista

Terminado o ano de 2013, aqui se deixa a respectiva revista europeia (de A a Z) para efeitos de memória futura e com tudo o que de subjetivo e aleatório pode envol­ver uma escolha e um exercício desta natureza:
Alemanha – O gigante económico da Europa da União fortaleceu, a cada dia que pas­sou, o seu poder político. Voluntária ou involuntariamente, é a um verdadeiro pro­cesso de germanização da Europa que assistimos, mais do que a um processo de euro­peização da Alemanha – enquanto os seus Estados parceiros oscilam en­tre o medo do fortalecimento desse poder e o receio de perderem o apoio que a Ale­manha lhes pode dispensar. Contradição que 2013 não contribuiu em nada para resolver. Bem pelo con­trário.
Barroso (José Manuel Durão) – Depois de um início de segundo mandato à frente da Comissão Europeia em que foi completamente ultrapassado pela lógica in­tergoverna­mental imposta pela Alemanha à União Europeia, recuperou algum pro­tagonismo directamente proporcional à aproximação do fim do seu mandato. Se o sonho comanda a vida, o sonho de um inédito terceiro mandato pareceu coman­dar a sua actuação. Pode ter despertado tarde da sua letargia.
Chipre – Chipre constituiu o exemplo mais traumático de resgates efectua­dos pela troika, neste caso devido a grave crise do sector financeiro e bancário da ilha. Não pelo valor do empréstimo concedido mas pelas condicionantes impostas pelos credores, que obrigaram depositantes nos bancos a suportarem parte dos custos da respectiva reca­pitalização. Pela primeira vez na história da UE ultrapassou-se uma linha vermelha e abriu-se um precedente perigoso – os depósitos bancários passaram a poder ser confiscados para contribuir para pagar erros de gestão bancária. O Parlamento de Nicósia ainda ensaiou opor-se à medida, mas a força da realidade acabou por se impor.
Dijsselbloem (Jeroen) – O socialista holandês que sucedeu a Junker na presidên­cia do Eurogrupo e que, não raro, se tem mostrado mais ortodoxo que os ortodo­xos alemães em decisões concretas que têm sido tomadas – de que, talvez, o meca­nismo de gestão de falências bancárias seja o exemplo mais acabado.
Eslovénia – A Eslovénia posiciona-se como um dos mais sérios candidatos a rece­ber novo auxílio financeiro das instituições europeias quando, na sequência dos resultados dos testes de ‘stress’ supervisionados pela UE, se constata que as ne­cessidades de re­capitalização da banca do país ascende a 4,8MM€, até junho de 2014.
Federalismo – Por oposição ao trilho intergovernamental constitucionalizado com o Tratado de Lisboa, é cada vez mais o caminho alternativo que parece poder tirar a União da letargia para onde foi encaminhada. Durante muito tempo constituiu a pala­vra maldita e o conceito tabu do projecto europeu. Tão só porque ousaram equipará-lo a outros modelos federais existentes. Também aqui a UE deverá inovar – e optando por uma via federal será seguramente uma via original e não duplicada de qualquer outra existente. Terá como componente o necessário reforço das instituições comuns, a respectiva relegitimação democrática, a recusa do modelo do diretório, a afirmação da via supranacional e o respeito pelo princípio da subsidiariedade. Em 2013 prefigu­rou-se, sem complexos, como um dos (poucos) caminhos possíveis a seguir para se ul­trapassar a crise que vivemos.
Grécia – Continuou a ser o país-problema da União Europeia. Com dois resgates e a caminho dum terceiro, cortes de dívida a credores particulares e enorme agita­ção so­cial cabe-lhe entrar em 2014 a presidir ao Conselho da União – com a res­ponsabilidade de demonstrar que um Estado pode estar em estado de emergên­cia financeira sem que isso signifique que abdica das suas funções políti­cas no quadro da União.
Hollande (François) – Iniciou o seu mandato como a grande esperança da esquerda eu­ropeia contra o austeritarismo ortodoxo germânico e em nome das políticas de cres­cimento económico, como caminho que a própria Europa devia seguir; encerra 2013 com a França sujeita à mais elevada carga de austeridade fiscal da V República e os ín­dices de popularidade mais baixos de qualquer chefe de Estado francês desde que há registos e medições dos mesmos. Pior saldo do ano – potencía o crescimento eleitoral da Frente Nacional de Marine Le Pen a patamares nunca antes vistos nem alcançados pela extrema-direita gaulesa.
Irlanda – Termina 2013 anunciando que, finalizado o seu resgate, quer ver-se li­vre da troika e das instituições europeias com uma “saída limpa”, sem depender dos humores dos burocratas de Bruxelas, sem segundo resgate ou, sequer, sem essa incógnita cha­mada programa cautelar. Decerto – os juros a dez anos na or­dem dos 3%, uma almo­fada financeira de cerca de 25MM€ e as necessidades de finan­ciamento garantidas até meados de 2015 ajudaram a tomar uma atitude que objectivamente espantou quase tudo e quase todos.
Junker (Jean-Claude) – O democrata-cristão decano dos líderes europeus, talvez o mais europeísta de todos eles, resto sobrante da geração de Kohl e Mitterrand, dei­xou de ser Presidente do Eurogrupo e Primeiro Ministro do Luxemburgo (ape­sar de aqui ter ganho as eleições legislativas, ainda que só com maioria rela­tiva). Paradoxalmente, pode ser a oportunidade para um 2014 mais risonho, com a Presidência da Comissão Europeia ou a Presidência do Conselho Europeu.
Kenny (Enda) – O Taioseach (Primeiro-Ministro) irlandês viu-se catapultado para as lu­zes da ribalta europeia quando o plano de ajusta­mento que negociou e conseguiu im­por à troika terminou com uma “saída limpa”, sem necessidade de qualquer programa cautelar. Com discrição mas firmeza, sem subservi­ências nem seguidismos provincia­nos, liderou um país sob resgate com prudência e bom-senso. Os resultados viram-se. Declarou prescindir de novos apoios internacionais e granjeou reputação e credibili­dade suficiente para ser encarado como uma das mais fortes possibilidades para vir a suceder a Durão Barroso à frente da Comissão Euro­peia. Resta saber se o desejará.
Letta (Enrico) – O democrata-cristão, membro do Partido Democrático de centro-es­querda, salta para a primeira linha da política europeia ao conseguir formar governo em Itália, baseado numa coligação instável com o Povo da Liberdade de Silvio Berlus­coni. Teve o difícil encargo de suceder a Mario Monti, o eurocrata que liderou o go­verno de Roma entre Novembro de 2011 e Abril de 2013 restituindo-lhe a credibili­dade perdida sob a liderança de Berlusconi. Apostou inequivocamente na via europeia para rumo dos primeiros meses da sua governação.
Merkel (Angela) – A chanceler alemã, que traiu Helmut Kohl e desonrou o seu legado europeísta, foi uma das grandes vencedoras de 2013. A sua política ortodoxa e austeri­tária face ao sul da Europa em provação e de germanização da UE foi amplamente su­fragada pelos seus concidadãos em eleições internas. Cada vez mais governa mais a Europa sendo escolhida apenas pelos alemães. Nem a mudança de parceiro político lhe alterou os hábitos ou fez mudar o rumo. Nos sociais-democratas do SPD encontrou aliados para a sustentação de uma política europeia que ainda acredita que podem existir ilhas de prosperidade em mares de desesperança. Quando a desesperança der à costa da ilha germânica, o rumo será alterado. Até lá, vai mandando. Bruxelas e as demais capitais europeias vão obedecendo.
NATO – Ainda não foi em 2013 que a organização de defesa militar do ocidente logrou alcançar um nível de articulação satisfatório com a União Europeia em matérias de se­gurança e defesa. É um daqueles casos em que a responsabilidade não pode ser assa­cada à organização transatlântica. Se o pilar europeu da aliança não se mostra suficien­temente sensibilizado para o tema nem se consegue articular e coordenar satisfatori­amente entre si, dificilmente a União que formam se pode entender com a organiza­ção de defesa que, paradoxalmente, quase todos integram.
Orban (Viktor) – A Hungria, liderada pelo Primeiro-Ministro Viktor Órban, conseguiu saldar a dívida de 20MM€ que tinha para com o Fundo Monetário Internacional desde 2008, sete meses antes do prazo previsto. Com uma liderança frequentemente criti­cada pelas suas opções conservadoras, o Governo de Órban considerou que a Hungria vai conseguir financiar-se nos mercados financeiros internacionais depois do que cha­mou “uma luta pela liberdade de atuação do país”.
Portugal – Exemplo acabado e consumado das políticas erráticas concebidas e impos­tas pela troika, inicialmente acolhidas com entusiasmo por parte do go­verno, entusi­asmo que se foi perdendo à medida que o tempo foi passando. Quem se der ao traba­lho de comparar os números previstos para final de 2013 no memorando de entendi­mento original e aqueles que, de facto, se atingiram (em termos de défice, dívida pú­blica e desemprego, por exemplo) tem a noção clara da errância das referidas políticas austeritárias.
Quadro financeiro 2014-2020 – O Conselho e o Parlamento Europeu puseram-se de acordo relativamente ao quadro financeiro plurianual da UE. Denotou ambição pouca e ousadia nenhuma. Com orçamentos que continuam a ser inferiores a 1% do PIB co­munitário não é possível ousar sonhar qualquer aprofundamento das políticas comuns. Enquanto a UE não se dotar de meios financeiros suficientemente capazes, as suas ca­pacidades de intervenção estão limitadas e definitivamente cerceadas.
Rompuy (Herman Van) – O Presidente permanente do Conselho Europeu pareceu ga­nhar algum protagonismo à medida que a crise por que passou a UE em 2013 foi abrandando e foram surgindo ligeiros sinais de retoma económica. Pese embora esse facto, continuou por se perceber a utilidade do cargo e da função. E se o hábito não faz o monge, neste caso o monge não fez nem justificou uma função que veio, inequivo­camente, introduzir um elemento de confusão na estabilidade institucional da União Europeia. Terminará o seu segundo mandato em 2014.
Secessionismos e Separatismos – Constituem o pior legado que 2013 deixa a 2014: a marcação de referendos independentistas e separatistas em 2014 para a Escócia e para a Catalunha podem obrigar a União Europeia a defrontar-se com um problema novo em mais de 60 anos de projecto europeu – o da integridade territorial dos seus Es­tados-membros, que é como quem diz, da sua própria integridade territorial. Mais grave que isso, os referendos prometidos, a realizarem-se, podem constituir prece­dente sério para outras aspirações independentistas que se encontram apenas ador­mecidas.
Troika – Os coordenadores dos principais grupos políticos na Comissão Econó­mica e de Assuntos Monetários do Parlamento Europeu e, posteriormente, a pró­pria eurocâ­mara, decidem lançar um processo de inquérito à actuação da troika nos planos de res­gate lançados nos últimos três anos. A investigação pretende apu­rar, ainda, a “legiti­mação democrática das decisões tomadas” pela troika nes­ses processos.
Ucrânia – Não pertencendo à União, foi o palco onde se travou a última disputa entre a UE e a Rússia sobre as respectivas esferas de influência. Contra a vontade de milha­res que se manifestaram nas ruas, o governo de Kiev deu sinais de tombar para o lado de Moscovo, recusando associar-se à parceria com Bruxelas. Território de fronteira e zona de influência ambicionada tanto pela Rússia como pela União Europeia, protago­nizou o reavivar dos tempos da guerra-fria, onde a influência em cada palmo de ter­reno geoestratégico era disputada ao milímetro. Estando fora da União, por paradoxal que pareça, a Ucrânia pode vir a determinar muito do sucesso ou insucesso da sempre anunciada e nunca concretizada política externa e de segurança comum.
Vilnius – Foi na capital da Lituânia que ocorreu um dos maiores desaires da UE em ma­té­ria de política exterior comum no ano de 2013. A Cimeira da Parceria Oriental da UE com a Ucrânia, a Geórgia, a Moldávia, a Bielorrússia, a Arménia e o Azerbaijão ficou marcada pelo desacordo entre a Ucrânia – pressionada por Moscovo para não assinar qualquer acordo com a União – e a UE. Ao não assinar o acordo que marcaria a apro­ximação ucraniana à UE os resultados da Cimeira restringiram-se à assinatura duma primeira versão de acordo com a Geórgia e a Moldávia e um acordo de facilitação de vistos com o Azerbaijão. Foi pouco.
Xavier (Bettel) – O Presidente da Câmara da Cidade do Luxemburgo tornou-se o improvável Primeiro-Ministro do Grã-Ducado, após a realização de eleições legislativas em que Jean-Claude Juncker, apesar de liderar o partido mais votado, não logra alcançar a maioria absoluta, deixando o poder nas mãos de uma coligação governamental formada pelo Partido Democrático, o Partido Operário Socialista e Os Verdes.
Yousafzai (Malala) – Jovem paquistanesa de 16 anos que, baleada na cabeça pelos tali­bãs quando regressava da escola, recebeu o “Prémio Sakharov do Parlamento Europeu para a Liberdade de Consciência” perante o plenário da eurocâmara de Estrasburgo, apelando de forma vigorosa ao direito das crianças à educação.
Wharton (James) – Deputado conservador britânico, autor de um projeto de lei apro­vado pela Câmara dos Comuns – numa sessão em que a oposição trabalhista apenas participou no debate e esteve ausente da votação – destinado à realização de um refe­rendo sobre a permanência do Reino Unido na UE em 2017.
Zagreb – Foi nas ruas de Zagreb que os croatas assinalaram, em clima de festa, a 1 de Julho de 2013, a adesão do seu país à União que, assim, se tornou o 28º Estado-Membro da UE, numa altura em que esta atravessa a sua mais profunda crise desde a origem do projeto europeu.